infancia partindo
Dona Railda
Acordava cedo
Lavava os pratos,
A barulho me embalava na cama
Varria a casa:
Era a vassoura que me acordava
Acorda, menino!
Era a escola me chamando
Que raiva!
O cheiro de café
O pão já esquentando na chapa
Do fogão de lenha.
A fumaça preta no ar
A parede da cozinha
Era noite até pela manha.
- Seu conguinha secou!
- Secou, foi?
Tomava café enquanto
Terminava o dever de casa
Ela já me calçava,
Se meu pai visse me olhava feio
- Não sabe nem calçar os sapatos?
Tão gelado por dentro
Era o sapato.
Puxava minha perna,
Ajeitava a barra da minha calça,
Dobrava direitinho
O café balança na minha mão
Pingava na toalha
E o dever de matemática
Era tão dificil.
A vergonha de não
Saber era grande
E mentia minha inteligência
O Nego Dopim
Sempre me ajudava
“Não sei como sabia tanta coisa”
Na janela, Boy
Me chamava
- Vamos juntos?
E ela me dizia
Que sim com os olhos
De mil anos.
Pendurado em suaw mãos
Ia até a porta da rua.
Me dava um beijo
Na cabeça
E abria meus cabelos,
Recheado de pilho
“Que vergonha de ter tanto piolho!”
- E de defunto, por isso não acaba.
Me consolava
E muitas vezes tinha sucesso
E suas unhas ficavam nojentas
Na subida do colégio
São Pedro,
Boy me contava
Que seu pinto já tinha cabelo...
E eu retrucava se não dava piolho.
Ele não sabia dizer.
Fiquei com medo de ter
Cabelos em mais lugares.