infancia partindo

Dona Railda

Acordava cedo

Lavava os pratos,

A barulho me embalava na cama

Varria a casa:

Era a vassoura que me acordava

Acorda, menino!

Era a escola me chamando

Que raiva!

O cheiro de café

O pão já esquentando na chapa

Do fogão de lenha.

A fumaça preta no ar

A parede da cozinha

Era noite até pela manha.

- Seu conguinha secou!

- Secou, foi?

Tomava café enquanto

Terminava o dever de casa

Ela já me calçava,

Se meu pai visse me olhava feio

- Não sabe nem calçar os sapatos?

Tão gelado por dentro

Era o sapato.

Puxava minha perna,

Ajeitava a barra da minha calça,

Dobrava direitinho

O café balança na minha mão

Pingava na toalha

E o dever de matemática

Era tão dificil.

A vergonha de não

Saber era grande

E mentia minha inteligência

O Nego Dopim

Sempre me ajudava

“Não sei como sabia tanta coisa”

Na janela, Boy

Me chamava

- Vamos juntos?

E ela me dizia

Que sim com os olhos

De mil anos.

Pendurado em suaw mãos

Ia até a porta da rua.

Me dava um beijo

Na cabeça

E abria meus cabelos,

Recheado de pilho

“Que vergonha de ter tanto piolho!”

- E de defunto, por isso não acaba.

Me consolava

E muitas vezes tinha sucesso

E suas unhas ficavam nojentas

Na subida do colégio

São Pedro,

Boy me contava

Que seu pinto já tinha cabelo...

E eu retrucava se não dava piolho.

Ele não sabia dizer.

Fiquei com medo de ter

Cabelos em mais lugares.

Ariano Monteiro
Enviado por Ariano Monteiro em 20/04/2012
Reeditado em 20/04/2012
Código do texto: T3623921