Uma menina querendo brincar
Vem essa moça
Que acorda cedo
Abre ao céu
Com sua trouxa de roupa,
Equilibrada em rodilha
Descendo o caminho de pedra....
Os pés lascados,
Fendas profundas negras.
Que sangram quando lava
E quando anda!
O espelho de seu banheiro
Embaça sua beleza
De tão velho e amarelado
De modo que nunca se vê como é.
A cada olhada, um precipício
A lhe rondar..
Cresceu cedo
Não viu
As meninas de baton
As matinês na praça da Bandeira
O menino bonito da casa do lado
Nem mesmo aqueles
Que lhe amaram de longe.
Seu coração míupe
Via só preço da carne
Da farinha.
Os livros da escola.
Os pratos sujos.
E casa empoeirada.
A hora de dormir.
A vassoura de piaçava.
As conversas cansativas
Dos tios velhos e vencidos
Emparedada
Não sente mais a
Vontade de comer,
De usar uma saia bonita
De ir ao médico
Cuidar dos pés,
De cortar os cabelos de maçaroca.
De passar sabão desses de farmácia.
De dançar, nem que seja
Sozinha.
As unhas nunca viram um esmalte.
Mas os olhos reflete,
Ao contrário do que se pensa,
Uma menina querendo brincar.