TRATADO SOBRE TEU CORPO

Imagino teu corpo
e refaço o Tratado de Tordesilhas.
Entre continente e ilhas,
procuro meu porto.
Percorro do queixo ao umbigo:
à direita sou português,
à esquerda sou espanhol;
um seio chamo de Inês,
o outro chamo de amigo;
o fado me afasta do cais,
as castanholas me apontam o sol.

Se prudente, rumaria para o leste.

Meu coração navegador,
no entanto, remete-me ao sul.
Terras não desbravadas
despertam sereias-sementes de dor
e surge da bruma o barco que investe,
como um dragão envolto no azul,
a iluminar suaves enseadas.
Aventureiro, não quero apenas
deter-me na sublime visão
das matas, dos montes e das grutas.
Dispenso as carícias serenas.
Quero antes a volúpia da invasão
suavizada por doces permutas.

Relutante, cruzo a linha do Equador
e me reconheço num tempo ancestral,
misto de prazer e sofrimento.
O corpo dissociado da alma.
O espaço dividido entre o bem e o mal.
A desordem do Universo em um momento,
o destino suspenso num ato de amor
e a turbulência a prenunciar, enfim, a calma.
Nelson Eduardo Klafke
Enviado por Nelson Eduardo Klafke em 16/04/2012
Reeditado em 17/08/2014
Código do texto: T3616537
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