Maria

Há poesia no instante oculto

por este outono de abril

ameno

sob os ventos coloridos

das tardes ermitãs

há os pássaros que cantam

os finais de tarde que

entram pelas portas e

janelas

e já não se pode apagar

o horizonte traçado a giz

incendiado em vermelho

onde caem sóis atrás dos montes

incriados

dos seios dóceis da terra

enquanto o azeviche da noite

envolve o desamparo do dia

e brinca com o teu nome,

Maria

das tantas noites de estrelas

te esperando entrares

pela minha janela

te esperando na nossa cama,

Maria

por entre a febre do meio das tuas pernas

despindo meus quinze anos

despindo tua calcinha vermelha

teu perfume de rosas

tua boca mastigando as palavras

antes de dizê-las para o quarto

morrendo do teu gosto

teu corpo a me perguntar se gozei,

Maria

pergunta, Maria...

diz, Maria...

novamente

os indecifráveis nomes

do meu corpo no teu corpo

que o tempo passou sem teus olhos,

sem teus abraços,

sem nossos lençóis,

o tempo passou, Maria,

fazendo de tudo um passado

guardado em velhas gavetas,

enroscado em tanto amor

que quando lembro de ti, Maria,

já não te chamo pelo nome,

te chamo de minha flor

Maria,

a vida era tão pura entre os teus seios,

origamis de seda e de tule

carícias de beijos

que o tempo tornou lembrança

que o tempo passou,

Maria,

e trouxe tuas coxas,

trouxe teus lábios,

trouxe teus olhos negros,

teus cabelos

negros, negros, negros

como as nossas noites

feitas de sonhos girando

nos teus beijos de mulher

boca suculenta

caju maduro

desejos roubados

de uma vida qualquer

faces no espelho,

mentiras,

te perdi novamente...

...

Este silêncio no fim de tudo

palavras que o murmúrio escondeu

paixão nos poucos anos que eu tinha

Maria,

quando lembro de ti

no fim de tudo

ficou um carinho imenso

e as flores que nunca te dei

apressado que eu estava

para me arvorar um passado

onde eu pudesse viver minha nostalgia,

Maria.

Agora são 23 horas e 38 anos depois

Cada dia passou com o seu tom de saudade

às vezes tão lentos

às vezes com pressa

conforme seja gelo

ou seja fogo

o meu coração

que ainda é teu,

Maria

Tudo tão imperfeito

a vida tirou você do alcance dos meus olhos

mas não te tirou dos meus sonhos,

do meu peito

inocência

amor guardado em canduras

ventos soprando brisas em teus cabelos

brumas cobrindo a ausência

berço noturno,

cama,

linho

Maria,

Teu perfume é o tempo que eu espero

nas madrugadas sem ti

do teu corpo fiz as margens

deste rio que volteava no teu mar

onde pus a navegar os meus barcos

como criança diante do encanto das águas

e como se desconfiasse que partias,

tu ias

Mar/ia

E o meu medo

e o rumor dos teus passos

emudeceram o dia em um silêncio,

sílaba por sílaba,

intransponivel

como uma noite sem você