CASA

quero um lugar onde possamos dividir-nos

sem fatiarmos um ao outro, e inteiros,

quase completos e quase perfeitos,

não tenhamos medo de rachar-nos construídos, ao meio...

esse lugar só nosso, onde o espaço será bem ocupado,

infinitamente amplo ou profundamente restrito,

basta-nos! Fundamental será sentir o amor contido,

cuidadosamente espalhado, nesse ser unificado por tanto chamado.

Um lugar onde possamos entender o sentido exato do ato de casar,

onde a palavra-chave não seja arrependimento ou dependência

ao enfronharmo-nos nos sonhos segredados dos travesseiros, um no outro

até mesmo quando, intrometida, a saudade chegar em nossos corpos, de visita.

E, se alguém insistir em ficar por perto,

esse alguém saberá que nesse espaço único

não sobrará lugar para quatro, cinco, seis mais pessoas!

Ele, na teoria da receita, deverá conter dois corpos em um, indivisíveis;

enquanto neles, ajustadas, almas não saberão mais ficarem solteiras

mesmo quando o espaço físico da casa nos separará por aposentos.

É claro que haverá um canto para que o santo, de fé ou cabeça,

nos ouça quando um palavrão impensado for dito em alto e bom som;

aí então deveremos ter todo cuidado, mesmo sem muito jeito ou tato,

para entendermos que em cada pedido de perdão há uma graça

sempre com mais carinho, e de joelhos juntos ou trançados

estaremos unidos do chão ao espaço, dos pés às mãos.

Ah, a cama!...

é aí onde o amor começa a crescer sem precisar engatinhar;

nascido, nos deixa uma vontade gostosa de permanecermos juntos.

Aí o silêncio aprenderá a falar mais baixo

consciente de que as paredes não limitam

o prazer da probabilidade do choro dentro da noite.

E, enquanto calados,

dá-nos uma vontade enorme de criar um feriado a cada meio de semana

até o dia em que estivermos mais maduros ou sérios

em meio a desejos cada vez mais juvenis!

Nesse lugar,

divididos sem nos fatiar,

seremos os mais prosaicos dos mendigos,

santos e putos grudados nesse amor sem esparadrapos

e antropófagos quando famintos saborearmos todo guardado, juntos!

Descobertos,

não haverá como desabar o teto

da entidade casa que agrava-se

qual museus: distante da curiosidade do ser humano.

E, sem alardes,

um homem e uma mulher ocupam o mesmo espaço

até dormirem cansados e reféns do profundo silencio

da casa

que nos guarda momentaneamente!