Há um silêncio

Há um silêncio em tudo

na flor,

na noite,

na sombra

na vida

nos olhos que erguem-se para olhar o mar

vagando em busca de palavras

que transformem o fim em rima

Há um silêncio em cada esquina

permeado de receios

e ternuras

escondidos no que não te disse

no que ficou por falar

e nossos olhos, poetas,

brincando no quadro-negro da noite ditosa

escreveram inícios de versos em esperanto

“luno”, “pace”,

“vojo”, “vivi”,

“belega”, “rigardi”

E no espaço imponderável do infinito dos versos

escrevemos, afinal, a palavra “fim”

na lenta manhã, onde o azul doía dentro de mim

onde o gesto se exauria

Há um silêncio de trintas anos

numa praia de areias finas

num feriado qualquer

num fevereiro banal

carnaval

Há um silêncio retalhado no teu nome

no teu sobrenome polonês

que eu nunca soube dizer

nem quando te aninhavas em meu colo

e eu sussurrava ao teu ouvido

o amor que guardaria para o tempo impenetrável

sem desconfiar que somos personagens

nas auroras e nos crepúsculos da poesia que espera

e transforma o monólogo do destino em odes e barcarolas

Agora já não importa

o primeiro encontro

a surpresa

um mistério inopinado

silencioso

como esta ausência começada que bebi

junto com a formosura dos teus lábios

E tudo mais foi silêncio

quando o tempo engoliu o grito

na iniludível tarde

houve um silêncio em tudo

resposta do eco ao qual me exponho

na seta inquebrantável do instante

entreabrindo

e fecundando o Infinito