carta ao meu pai
trago notícias de longe, meu pai.
de um lugar onde o vento se esforça
pra chegar, e mal tem água pra lavar
as mãos.
nem luz elétrica tem. (já acostumei
a pegar no sono depois do sol cair)
moro entre duas velhinhas simpáticas:
a mentira e a morte.
uma,
vive a contar asneiras. finjo de bobo
pra ela não se irritar. às vezes, até
dou cabimento às suas histórias só de
maldade, mas já me acostumei com ela!
a outra, sabe, me parece maliciosa...
nossa relação é monossilábica e cheia
de sinais corporais, como se fossemos
dois surdos...
havia outra,
chamada esperança, mas morreu
de forma trágica: secou como uma rosa
de tanto esperar um par chamado amor.
por aqui, normalmente, não acontece
nada.
quem
quiser alguma coisa, que invente. eu,
inquieto que sou, resolvi aceitar os
conselhos do dono do único botequim
que existe pelas redondezas, um velho
de cabelos brancos e pernas cambotas
chamado sêo esquecimento,
e escrever essa cartinha para o senhor.
um beijo, meu pai.