O infinito azul
Hoje é um desses dias em que não se pensa em coisa alguma a não ser na lonjura das horas
É uma tarde estranha com cheiro de saudade ...estou aqui há pouco mais de uma hora ...alguém já devia ter vindo a minha procura, não é certo que eu fique só por tanto tempo já não disponho de tanta força física pra caminhar
Tenho ainda que preparar algumas palavras bonitas e sinceras pra distribuir logo mais á noite, se decidi está presente no meu aniversário .
Só por hoje deixarei de ser poeta, não direi palavras belas nem tontas nem histórias tantas nem sonhos ! Estou seca, não interrompam o silencio do meu dia!
Murmurava a beira da praia, quando avistei minha pequena, aquela a quem eu dedico um amor maternal mesmo não á tendo dado a luz, de certo ela escutara o meu pensamento pois aproximou-se me beijou um dos olhos como de costume e voltou a brincar. Senti um enorme alívio na solidão, e solidão não é abandono é como recolher-se, encolher-se e só.
A doença não me assusta ... mas tenho tido sonhos bons e antigos que me rasgam a alma inteira e me arrastam na lama, me deixam sem mais, eles são a prova viva de que eu queria ficar mais um pouco aqui nesse mundo de tantos mesquinhos onde cada sorriso é um milagre.
Por tudo que eu ainda não senti e os rostos desconhecidos que imagino existir, isso me faz querer ficar.
Tão jovem ainda, tão perecível, insatisfeita, indignada, minhas verdades e incertezas todas imbatíveis e insolúveis... sou quase um nó.
O sol já vai se pôr e até então ninguém veio a minha procura. Já devem está cansados o câncer que habita em mim também os mata, todos sofrem a minha volta.
Caminhei por volta de meia hora até a porta de casa e percebi que todos saíram entrei e deitei ali mesmo no sofá da sala, já não suportava ficar de pé.
Sinto que a fera jovem que bradava em meu peito perdeu as garras e minha mocidade agora é corcunda e débil, os pensamentos embaralhados o s olhos quentes, a boca seca, tão perto estou da morte. Adormeci, despertei com alguém batendo á porta, eram eles:
Meu amigos, familiares, namorado e piedosos que ao saberem que provavelmente seria o meu último aniversário fizeram questão de participar da festa!
Abracei os mais íntimos com sinceridade e muito afeto e voltei a sentar agora em uma almofada no cantinho escuro da sala de TV. Já não tenho paciência pra falar da vida, estou cheia de gente vazia!
Então estou sendo levada por uma melancolia doce, já posso sentir meu corpo leve e livre, estiquei as pernas devagar pra que me sentisse um pouco mais confortável e encostei a cabeça no móvel antigo que até então não havia notado.
Minha mãe repentinamente interrompe o momento solitário e me abraça com fervor, como se estivesse se despedindo ...e estava! Soluçando ela deixou a sala e saiu em direção a cozinha onde minha vó conversava com algumas beatas sobre o meu estado de saúde, juntando-se a elas minha mãe se desespera e sem perceber que todos á escutavam ela brada com todas as forças:
__ Não posso perder assim a minha filha!
__ Isso não é justo, eu não aceito! Não aceito!
__ Tão jovem! Tão cheia de sonhos...
Minha vó a consola e pede que mantenha a calma, saem juntas para o quarto dos fundos.
Hesitei em sair por algumas horas para que todos fossem embora, e então, quando senti que o silêncio me abraçava me arrastei até a cama.
Á noite parecia não querer passar e o meu corpo ardia em febre os pensamentos se misturavam e o medo de que o sofrimento fosse demasiadamente grande começara a me apavorar, a vida já não mais fazia sentido, o pesadelo precisava acabar.
Abri a janela sem fazer muito barulho e caminhei por algum tempo que já não sei, enfim senti meus pés na areia e o cheiro, o cheiro do mar. Sempre sonhei em dormir sob as ondas, em virar mistério, em fazer parte do infinito azul.
Andei por entre as águas e deixei fluir o desejo íntimo e desesperador que me atormentava a vida...
O mar agora é meu leito eterno.