O coração

O coração é uma gema no ovo;

Preso, mas sanguíneo e maciço,

De uma idéia fecunda e indelével.

O coração é uma barata no assoalho limpo,

Uma luva, numa mão de calos,

Uma pluma enterrada nas dunas;

O coração vagueia desertos inóspitos,

E traz consigo a culpa de ter viajado sem passaportes.

O coração é uma aranha madrasta, viúva, negra;

O coração estica o fio de qualquer sentimento,

E faz dele uma teia, e se acomoda dentro

E consegue boiar na artificialidade de uma idéia.

O coração dorme no peito como

Uma criança órfã,

É um bueiro filtrando guimbas,

Ou um cinzeiro cuspindo cinzas,

Uma casca de noz, sem nós

Com a gente dentro;

Casca amarrada em nós indesatáveis,

O coração é uma flor que sorri

Num vaso d’água,

Uma bailarina sem a perna esquerda,

É uma bola de fogo, de sangue,

Bola de vôlei que passa de mão em mão,

Bola, bola que bate no chão, no ar, no chão,

Bola, bola de fogo e sol, sol girando

Pôr de sol, sol sem se pôr

Em nada, sob coisa alguma,

Em tudo, um sol girando num estranho universo chamado

Peito.

Lou Gomes
Enviado por Lou Gomes em 06/03/2012
Reeditado em 06/03/2012
Código do texto: T3538171
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