Rapsódia Russa



Ela acordou olhando para Jesus Cristo,
e nem se deu conta de seu esquecimento.
Passou a noite tentando ser asfixiada
por um travesseiro de penas de ganso.
Tentou cortar seus pulsos no chuveiro,
mas depois de cinco minutos, passou.
Ela não entendeu porque deixou de ser,
para passar apenas a estar.
São vários atos de se despertar por dia,
como quem emerge do mar em fúria,
para depois, novamente, submergir.
Ela não era tão livre de tudo,
nem tão ciente do por quê da sua dor.
Só sabia que alguma coisa fazia sentido
quando estava entre o suicídio e a cura.
Entre o desamor de uma imagem de gesso,
e  o desejo por aquelas chagas abertas.

Hoje ela vai beijar várias coisas sem nome.
Hoje ela vai aspirar o pó da consciência.
Vai se desidratar de tanto ler Freud,
vai quebrar o ciclo dos clichês suspensos,
vai enterrar seu florete no peito de alguém.

Mas antes, vai desejar um pouco mais o corpo.
Vai querer acreditar que ainda há perdão.
Vai ver a doença florescer por entre as pernas.
E vai cobrir todas as partes de seu corpo
com o disface próprio da maquiagem da fé.

Mas tudo o que ela queria, era estar alí,
apenas dependurada numa parede branca,
sendo tão desejada quanto o corpo sangrento.
Por isso, ela reza.
Para os ícones e para os tanques de guerra.
EDUARDO PAIXÃO
Enviado por EDUARDO PAIXÃO em 01/03/2012
Código do texto: T3529085
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