A IDÉIA
A IDÉIA
A idéia surge nebulosa numa tarde idem.
Dividido entre o eu de fora e o eu de dentro
esse ser inexistente e a vontade de ser alguém
em movimentos lentos e trêmulos,
pensamentos desconexos e profundamente dialéticos
e rebelde como um rebento
a idéia desobediente da razão foi surgindo
cartesiana.
E está saindo o que podem ser algumas poesias.
Algumas por exemplo já estavam fora do baralho
Minhas poesias,
essas lentas disgressões sobre algo
que na realidade nem poesia deveriam ser,
embora me recuse a ver na rima ou mesmo nas
regras
estabelecidas a possibilidade de poesia,
nascem nesse momento imenso do existir
e nas madrugadas loucas e bêbadas
onde os bandolins tocam a marcham do adeus
enquanto as putas dançam o can-can-cão.
Mas nelas não há mais nenhuma emoção
apenas a ânsia de vômito e a vontade de ser poeta,
embora nunca o tenha sido
e a dessemelhança
da letra que nunca percorreu o papel.
Por isso a idéia foi crescendo
errática e lunática como que presa num labirinto
projeto inacabado e que um dia será idéia
se acabando em samba na avenida.
E eu me repartindo cada vez mais
eu, justamente eu, que gosto de ficar
no meu canto como voyeuer olhando as meninas
com suas pernas bonitas, seios redondos e cabelos grandes.
Mas numa dessas ressacas morais,
onde impera a idéia nunca a razão ou a emoção
ela se impôs como uma série de idéias e cantos,
idéia provisória como sempre,
mas a cada momento mais definitiva
e portanto eis-la aqui,
incompleta,
mas realizada como idéia
e não como concreto.
Como um dia te disse,
enquanto a paixão corria solta nos cantos de nossas bocas,
as idéias que da vida tenho
são como as paixões com que me conquisto:
são idéias e são reais.
Mas não são nunca concretas.
Porque de concreto só esse tesão e esse amor por você
que fazem dessa idéia ser algo como uma canção
colorida como devem ser as flores que brotam de nós.