Rural
Resgato boiadas
Do fundo
Dos meus
Olhos!...
Gado leiteiro e de corte,
Branco, negro, bege,
Malhado, molhado...
Saem do nada,
E atravessam o rio a nado...
O rio largo,
Que não secou
E cercou, entre suas margens,
Um pedaço de tempo,
Um pedaço de história,
Um quadro que ninguém pintou,
Umas cenas que até hoje boiam, naquele exato lugar...
À espera da mão de Deus,
Para abençoar
E aclamar!
E acalmar...
É bonito demais ver uma boiada
Atravessar um rio a nado!!!...
A certa distância,
Era o que eu mais gostava de apreciar,
Como a um rico mural,
Quando me foi dado experimentar a vida rural.
Só agora percebo
Que nunca via boiada atravessar o rio
Para o lado de cá.
Era só para o lado de lá!
Era o gado vendido...
Do lado de cá,
A maior parte do gado existente era nativo,
Dali mesmo,
Onde havia nascido, crescido...
Onde havia sido vacinado, tratado,
Reproduzido, desleitado, engordado...
Para depois ser despedido!...
Para o lado de cá, nunca vinha boiada.
No máximo, algumas vezes,
Algumas reses...
Vacas, bois,
Garrotes, novilhas, bezerros...
Em cada um, via-se uma marca na traseira,
Feita a ferro quente.
Era de praxe marcar assim,
Com ferro em brasa e dor,
Para personalizar a posse do dono.
Dor que só o gado sentia!
Será que só o gado sentia,
Ou também sentia a dor quem o ferrava
E alguém que via?...
Gado ferrado...
Gado marcado.
Cada dono diferente,
Mais um ferro,
Uma marca a mais...
Uma dor mais quente!
Nunca víamos a morte da bezerra!...
Todos eles iam morrer lá longe,
Nos matadouros...
Depois de atravessarem o rio.