Os teus olhos, minha mãe
Os teus olhos, minha mãe,
estão doentes.
Já não vejo neles o reflexo
de um menino que dizia:
"amo-te, muito, muito, muito..."
Já não vejo neles a alegria que inventavas
com os restos da vida que escolheste,
nem as histórias que inventavas
com os restos da infância que me deste.
Os teus olhos, minha mãe,
estão doentes,
não me servem assim, ausentes,
não me servem:
o que menos preciso agora é dessa culpa,
desse fado que te serve de desculpa.
Longe vai o tempo em que eras tu
o centro do meu mundo,
agora o meu saber é mais profundo,
o meu caminho mais largo,
o meu círculo mais viciado.
E se um dia eu te disser:
"minha mãe, o melhor de mim,
levaste-mo nos teus olhos"...
deixa lá, já vai ser tarde demais.