Entardecer

Amo o entardecer dos poemas,

círios acesos,

liríos diáfanos,

tatuados na pressa do mar,

compondo a música fragrante e o anoitecer.

Úmido leito onde a vida dói e pulsa,

onde as vozes confundem-se com a maresia

e a saudade abandona-se lenta e incomensurável.

Na escuridão esculpida pelo perfume e pelo tremeluzir da noite

dormem os poemas que os ventos transformam em dunas silentes,

bordam no céu almiscarado este navio noturno soluçando a penumbra do mar,

cenário para a lua,

e a sombra do seu cansaço.

Transfomam em fogos e estrelas,

que irrompem das palavras cintilantes, luminosas, ao lume da solidão calcinante.

O entardecer cor de malva,

dissolve-se em manchas azuis e lilases no alaranjado das horas e nas palavras dispersas recendendo à alfazema,

espargindo mares e astros e mundos feitos de barro e cores pertubadoras das aragens e dos sonhos,

onde voláteis luas incandescentes rasgam o silêncio dos fins de tarde entrelaçadas aos poemas latentes emergindo na alucinação dos crepúsculos.

Amo o entardecer dos poemas.

Amo o tempo que só aos poemas pertence,

tempo de horas ausentes,

tempo da alma arrulhando carinhos no éter,

tempo de sombras no espelho,

tempo de espaços inesgotáveis,

tempo do grito silente e antigo tolhido na branca janela,

tempo de amores que suavemente bafejam a pele com a imperceptível respiração das folhas de papel,

neste indecifrável novelo de letras sobre o papel.

Amo o entardecer dos poemas,

quando o bronze das sílabas desprende-se dos dias

incendiando o mar,

rompendo as quilhas das noites,

estendendo o veludo manchado de sonhos

do que um dia foi amar.

As aves procuram as folhagens.

O som de um coração que o amor dedilha em cumplicidade com o mar evola-se no ar.

Os poemas e a música compõem a textura a paisagem e os segredos do inaudível luar.

Surgem as primevas incertezas das sombras.

Enigmas.

Monólogos.

Os poemas,

ébrios de horizontes coruscantes,

impregnados de silêncios,

de soluços pra namorar,

embalado por uma roda-gigante

com os olhos voltados pro mar.

Os poemas,

encharcados de tempos antigos,

dos sons anímicos do cosmos,

de cânticos e elegias,

do pranto que chora o fim,

entardecem,

quando os girassóis se inclinam

dentro

e fora de mim.