Quem me dera ser a flor e a vida

Quem me dera eu fosse o cerne

Que me conduz em cada passo

Do meu dia malogrado.

Quem me dera eu fosse o veneno

Que corre em meu sangue

Num fluído mais calado.

Quem me dera ainda fosse pequeno

Um sonho que em cada dia fana

A esperança da minha carne.

Seria eu meu defensor

Meu escravo e senhor

Nas horas estúpidas

E fúteis sem motivo de calar.

Quem me dera o mundo

Saindo livre do meu medo

E da minha inércia.

Eu não seria um reles mudo

Nem atiraria meu corpo

Às garras da ilusão.

Quem me dera eu fosse a pena

Que escreve os meus textos

E a palavra que reveste o meu saber

Num encontro dissonante

Entre o som e a beleza

Da poesia sem lírica e rima.

Quem me dera eu fosse um facho de luz

Nas sombras esguias que se camuflam

Na expectativa de um novo amanhecer.

Eu seria a áurea dos belos dias

E não entregaria o meu cansaço

Nas mãos da ganância.

Estaria eu a sorrir junto das crianças

Ensaiando uma cantiga

Para colorir as horas meninas

No quintal da minha casa.

Escreveria um poema de amor

À minha amada

E deixar-me-ia levar pelos rumos

Da longa estrada

Que me levariam até ela.

Eu seria feliz

Se a canção que estou ouvindo

Chegasse aos corações

Mais brutos e toscos.

Eu seria melhor do que sou

Numa súbita inversão

Dos meus valores.

Eu seria a menina nua

Que posa para o artista

Numa sublime pincelada.

Seria o entardecer

Na paisagem mais encantada.

Quem me dera eu fosse um verso

Que reveste a vida dos poetas.

Quem me dera eu fosse a amor

Que emana do coração dos amantes

Mais afoitos e felizes.

Eu seria a mistura perfeita

Da essência que veste a vida

Num simples respirar.

Eu seria você a sorrir para mim

Numa junção transcendental

Entre o brilho dos meus olhos

Com esse nosso amor ardendo em chamas

Transbordando pelas beirados dos nossos corações.

Quem me dera ser a flor

E a fragrância mais sutil

De uma orquídea.

Quem me dera ser a pétala

E o pólen.

Eu seria fruto maduro

Numa grande árvore

Que me fornece o aconchego da sua copa.

Quem me dera eu fosse o vento

Entre as asas das grandes águias.

Eu seria a vida

E seria tão livre quanto o próprio viver.

Márcio Ahimsa
Enviado por Márcio Ahimsa em 13/01/2007
Código do texto: T346067