CANOA DO TEMPO
Na praia deserta,
brincam de esconde-esconde
as Maria-Farinhas.
No espelho da areia,
duplica-se o silêncio,
reflexos de saudades de um paraíso distante.
A tarde se aquieta.
Ondas preguiçosas acariciam a areia.
Surfam as tatuíras. E depois se escondem.
Uma canoa abandonada.
Parado, o tempo. As sombras
se espicham. Alonga-se o meu pensamento.
Lentamente, o sol se põe.
Uma lua enorme e redonda,
emerge do mar imenso clarão.
Nas rendas de espuma branca
bordam-se reflexos
irisados de luz.
Pleno, o momento.
Em silêncio, com olhos de dentro,
medito.
Contemplo a beleza
de um lar prometido,
escondido dos olhos humanos.
Ondas de certezas vão e vem,
lambendo os meus pés.
Solitude, comunhão com o além.
(este poema é uma republicação... na versão anterior chamava-se CONTEMPLAÇÃO...)
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ORELHA DE PAU
Escuta os mistérios
que o vento murmura
na pele dos troncos
em voz de sereia.
E sabe da seiva a ternura
que corre na árvore, em sua veia.
E escuta os grilos e os sapos
em suas ritmadas serenatas...
E quando dormem os pássaros,
escuta das estrelas a solidão...
E ouve o silêncio das matas,
e sereno e orvalho e lua e amplidão.
Escuta o passo das formigas
e da cigarra ouve as cantigas.
E também escuta a brisa
soprando pelas grotões
quando a face da pedra alisa,
entoando suaves canções...
Orelha de pau escuta os mistérios da vida.
Enfim, escuta coisas que até Deus duvida.
(poema inspirado em haicai XXVI de Ana Flor do Lácio)