DO ABUTRE

engraçado este abutre

que se farta das minhas carnes ainda frescas

me tem a língua como acepipe

e os olhos como iguarias grotescas!

voava baixo, aninhou-se sobre minha cabeça

as garras tesas me atavam pensamentos

enquanto o bico de aço me furava o crânio

em busca de tenros alimentos

muito feio esse abutre

que me recorta a pele ainda viçosa

voraz, transformou o fidalgo

em criatura andrajosa

nidificou, pôs sobre mim ovos negros

que se partiram em rebentos de dor

as chagas abertas de um tipo de cristo

fadado ao abandono e ao desamor

engraçado este abutre

do qual não me desfaço

rompe me as tripas, inclemente

porém repousa seguro em meus braços