Ah, como eu gostaria

Ah, como eu gostaria

de compreender os acontecimentos

de minha vida da perspectiva dos estóicos

filósofos! Enfatizar o aspecto da transitoriedade;

evitar absolutizar sofrimentos

e alegrias. Mas, parafraseando o poeta,

valeria então a pena?

Esperança, sem ti, filha dos deuses,

última reserva da fatídica caixa,

que seria dos homens?

És a consolação única,

morredouro alento de viveres,

aos quais nada mais conferir pode

coerência.

Esperança, todavia, são

ventos contraditórios, que velas

impulsionam, em nossas muitas e particulares

odisséias, sem fazer chegar

às paragens familiares. Seguimos sempre

estrangeiros, em naus emprestadas,

em existências que não sentimos

nossas.

Esperança, que nunca vamos entender:

primeiro, deusa;

depois despida da condição de ente,

mas ainda não da divindade;

secularizada, tomou forma de ideologias

mundanas, históricas utopias;

reduzida, por fim, à sua suposta

dimensão biológica.

Pertences ao domínio dos ininteligíveis

e impalpáveis.

Alcançar-te é perder-te.

Infeliz do ser

de que és inspiração

e tormento!

Daniel Afonso
Enviado por Daniel Afonso em 17/12/2011
Reeditado em 18/12/2011
Código do texto: T3394061
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