VILAMUSA
VILAMUSA
... e é pelo teu corpo, de sinuosas ruas — tuas curvas —
meus caminhos, que dia e noite percorro,
com todos meus sentidos.
Tuas colinas são como seios:
fartos, firmes, túrgidos  entre eles,
teu regaço, onde repouso, guerreiro,
do meu cansaço.
São teus morros as nádegas que acaricio;
onde me elevo, onde paro por um momento,
onde me aqueço ao Sol,
onde me beija o vento.
Nas praças, jardins e quintais,
são as árvores tuas coxas morenas,
que enlaço, fortes, rijas e serenas.
Nos teus vales ocultos, é onde desço, sedento,
ao encontro das fontes e regatos, e onde banho minha face, molho minha boca e sacio minha sede.
Pela manhã, acordas, criança e menina;
espreguiças, bocejas,
ao Sol que nasce da serra, que afasta o véu de neblina que o teu corpo vestia,
e suavemente o despe e o ilumina.
Lânguida e dormente, brincas sob a luz que lentamente
te aquece,
mas no dia que cresce, e avança, já não és mais criança,
já não és mais menina;
és agora adolescente, e no calor do meio dia, já não andas; antes, deslizas,
insinuante, provocante, convidativa, lasciva, felina.
Ao fim da tarde, ficas inquieta, agitada, nervosa, ansiosa,
mas ainda trigueira,
e os últimos raios do Sol te encontram, faceira,
e nele tomas o banho dourado do crepúsculo que chega.
Mas é à noite que vens ao meu encontro;
e para mim,
para mim apenas, creio,
é que revelas tua nudez por inteiro.
Em teu olhar, cintilam estrelas.
Tua pele retém ainda, do dia, o calor,
e exala, dos teus jardins,
o aroma das rosas, violetas e jasmins.
Tua alma pulsa, teu corpo vibra.
Aspiras, expiras e suspiras, ofegante,
à espera do amante.
És agora mulher.
E como estamos sós,
despudorada, finalmente
a mim te entregas,
de olhos cerrados, silenciosa.
Sob a Lua, luminosa,
tu te abres toda e fico
inteiramente dentro de ti.
És minha agora, somente minha.
Abraço-te.
Me abraças.
Somos unos, e enlaçados
vamos pelo mar da noite, sonhando, flutuando,
de paixão embriagados,
no barco da madrugada.
Tão intenso é o nosso amor
que já não sei:
afinal, sou eu que te possuo,
ou és tu que me possuis?
Sou eu que vivo em ti,
ou és tu que vives em mim?
O que sei,
com certeza, é que sou
de ti o poeta e o cantor.
E não tenho mais, uma dúvida sequer,
que és a musa que busquei
a vida inteira.
A primeira e única, a verdadeira,
e também a derradeira,
vilamusa,
vilamada,
vilamor,
vilamante,
vilamulher.
Tu foste o meu berço e
és hoje o meu terço;
Meu pecado e minha oração,
minha virtude e o meu perdão.
Foste a minha vida e o meu norte,
meu azar e minha sorte.
Viste a minha chegada
vês agora a despedida,
e só tu verás minha morte.
Da luta que hoje se encerra
desta batalha perdida,
peço-te: guarda-me em tua terra,
dá-me a última guarida.
Será ela, a tua carne, o meu
leito profundo,
onde por algum tempo
irei dormir e sonhar.
Saio hoje deste mundo
para um outro partir.
Como a ti dei minha vida,
vivida de amor e ternura,
abriga ó VilaAmada
esta alma combalida,
em tua sacrossanta sepultura!
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