PRO QUINHÃO DA NOSSA SOLIDÃO.
A felicidade de tocar, de inseminar, de florir, de ir.
Ser capaz de traduzir o ranger pelo afagar,
o despedir pelo acolher,
o fugir pelo aninhar,
o expulsar pelo acudir.
Ter energia para buscar o que a alma expulsou e depois surtou,
ter fôlego para semear o que a dor alinhavou na sua cova,
ter braços para juntar todo fogo perdido do medo,
do lastro, do lodo, do todo.
Depois quando não mais houver salivas nem suor, que seja,
depois quando o que trincou se mostrar enrigecido,
depois quando não mais tiver que pedir perdão pra ninguém.
Os risos serão respingados em dengos livres de todo sal,
o amor não fará mais a corte para os desabrigados da fé,
o fardo que se dizia aço agora só será ossos de algodão.
Mulheres, homens, bichos, o que vier, viverá, viverá sim,
os copos sumirão com seus bafos enferrujados de desprezo,
tudo que se disser presente, assim será, assim será.
Nessa hora o que quiser moer nossos miolos, sai daqui!
nessa hora o que tentar decepar nosso gozo, suma!
nessa hora o que teimar em coalhar nossos passos, se manda!
nessa hora o que insistir em esmigalhar nossos sonhos, rua!
Por mais que nos fizermos nódulos retintos deste confim qualquer,
por mais que forçarmos a barra das respostas, das desculpas,
das dúvidas, das mentiras surradas que habitam cada quinhão da nossa solidão,
por mais que nos soubermos fetos agora paridos, não adianta.
Quando o tempo vier estender sua mão tudo será dele.
E de mais ninguém.
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