Místico
Místico
Venho caminhando este caminho esvaído em quase amor,
quase sonho, quase luz, quase saudade, quase templos de cetim
Na impossibilidade de ser eu esta Alma emigrada de regresso a mim
E os meus olhos inconstantes são espelhos refletindo orgulho e dor
Canta ao longe a voz de um anjo - há algo de humano em seu canto
É a voz inefável que entre lembranças canta minhas cantigas de menino
Reverberam os meus sonhos de asas partidas no dobrar súbito de um sino
Que toca numa igrejinha que a minha alma guarda toda caiada em pranto
Canção de abrigo e de ternuras de um pressago de ausências e isolamento
Que moviam os meus passos sem um deus, sem um rosto que não se revelou
No tempo insurreto que nos meus olhos a insônia do mundo se realizou
Vaga sob um céu baixo despreendido da madrugada num etéreo lamento
Corre a brisa com seu pés descalços na poeira dos sóis, na lama das chuvas
Atadas às sombras e às tristezas as cordas de um balanço sem amparo
Arremessam-me no ar tolhido pelos perfumes de Pingo, pelo seu gosto amaro
Pingo... seus seios pontiagudos, corolas de eternidade, lábios e língua de uvas
Venho caminhando este caminho de ruas vazias, quase silêncio e abismo
E os dias são curtos para tanta ausência, para tanta perda... o tempo passou
Ao longo dos meus sonhos, de conchavo com meu medo, e insidioso ficou
Mostrando-me na inquietude da noite os vários rostos da morte... aforismo
Houve tempestades com seus ventos e trovões e raios que me ofuscaram
Mas o caminho não se desfez, a angústia tocou o místico em outras eras
E eu permaneci a morrer nos aromas dos ventos, na lágrima da rosa, quimeras
Morro, todos os dias. Não há principio nem fim aonde minhas vidas brotaram
Venho caminhando este caminho esvaído em quase amor,
quase sonho, quase luz, quase saudade, quase templos de cetim
[onde fogo e água se misturam,
quase vida, quase fim