nunca mais me banhei no poço azul...

Ontem eu tinha cinco anos...

E tudo o que era bom

passou em um minuto.

Hoje não derreto mais queijo

na chapa do fogão a lenha;

nem “quento” fogo nas frias

manhãs de junho no rabo da fornalha;

não como mais carne de lata, nem vejo

meu pai caçar perdiz com a cartucheira.

Ontem eu tinha cinco anos...

E tudo o que era bom

passou em um minuto.

Hoje não ouço mais modas

caipiras no toca-discos sonata;

não pego pequi no campo, nem

pesco lobó no ribeirão, não ando

mais a cavalo, nem sei mais jogar

o laço, nem o ouço o canário trilar.

Ontem eu tinha cinco anos...

E tudo o que era bom

passou em um minuto.

Não vejo mais briga de boi,

nem ouço bezerro berrando.

Nunca mais vi córrego cheio,

nem raposa pegando galinha.

Não vejo mais pica-pau, rolinha fogo

apagou, nem assanhaço na papaieira.

Ontem eu tinha cinco anos...

E tudo o que era bom

passou em um minuto.

Não bebo mais leite com

farinha de milho, não lembro

mais o doce que o melado tem.

Não como mais carambola, romã,

jabuticaba, cajá-manga, nem amora.

Nunca mais me banhei no poço azul...

Ontem eu tinha cinco anos...

E tudo o que era bom

passou em um minuto.

Nunca mais vi forno de barro,

broa de milho, biscoito frito na

banha, pele de porco sapecado,

farofa de tatu, traíra frita, pelota

de tamanduá, rapadura, linguiça

de porco caipira, mel de abelha jataí!

Ontem eu tinha cinco anos...

E tudo o que era bom

passou em um minuto.

Meu Deus do céu! Cadê o

canto do galo de manhã cedo?

Cadê meu pai no curral tirando

o leite, cadê meu cão que nadava

comigo no ribeirão; cadê aquele tempo

que eu ainda trago preso no meu coração?

Ontem eu tinha cinco anos...

E tudo o que era bom

passou em um minuto.

Agora já estou meio velho

e nem me lembro mais como

eu rezava uma salve-rainha...

Ontem eu tinha cinco anos,

e tudo o que era bom

passou em um minuto!

IVAN CORRÊA
Enviado por IVAN CORRÊA em 25/11/2011
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