A Invenção de Deus
A Invenção de Deus
A Hal 9000, Goethe e Profeta Gentileza
“Se, pois, todas as explicações teológicas, experimentaram crescente e decisivo desuso entre os modernos ocidentais, isto aconteceu porque as investigações misteriosas que elas visavam foram cada vez mais afastadas como radicalmente inacessíveis à nossa inteligência.” Auguste Comte.
Deus acaso existe? Tenha fé e crede!
A Máquina do Mundo e a do Universo,
Que prova de sua existência se não vede
A obra criada diante dos olhos como um verso?
Em que se desconte os textos sagrados, não lede?
Estamos de mais a mais aqui no mundo imersos...
Qual a solução para ver o que não vemos?
Se, no entanto, acreditar é o que mais queremos!
Tantos e tantos são os nomes de Deus:
Iehve, Marduk, Osíris, Athon, Alá,
Odin, Tupã, Olorun, Zambi, Zeus,
Júpiter, Brahma, Jeová, Dyaus Pitá…
Qual o deus verdadeiro dentre os seus
Milhares de nomes que a língua nos dá?
Se creio, porém, por que duvido?
Acaso sua face caiu-me ao olvido?
Hagia Sophia, a filosofia positivista
Fundamentando a base empírica
Da ciência metodológica e determinista
Exige até mesmo da lírica
A posição coerente com a palavra racionalista
Para domínio da técnica espagírica!
Como provar o que não vejo?
E se prová-lo é meu maior desejo....
Pudesse o desenvolvimento do Iluminismo
No seu sonho mais louco e científico,
Ultrapassando o mito de Frankenstein e seu cinismo,
Para além do Homúnculo inespecífico,
Para além do Golem e do androginismo,
Para além do onírico mais magnífico,
Criar-se não apenas a criatura,
Mas o criador com toda sua investidura!...
Se acaso, nunca se puder provar
Pelos ditames dos métodos da ciência,
O que o muito crer se faz por amar,
De um Deus a sua real existência,
Se a fórmula e o método nunca o demonstrar,
Se a lógica nos negar tal consciência,
Urge que a Ciência invente Deus,
Com toda sua onipotência a calar até os ateus!...
E esse ser supremo criado cientificamente
Como um super-programa da Totalidade,
Um software que faça da matéria existente
Seu hardware e ambiente da sua funcionalidade,
E se torne de tal forma independente
Do homem que domine a própria humanidade,
E assim, subvertendo a lógica da criação,
O criador se faça criatura por medo da solidão!
Urge que esse Deus inventado se presentifique
Diante das orações emocionadas dos fiéis,
Diante das palavras dos blasfemos e seus despiques,
Diante dos rituais diversos nos mais variados papéis,
Diante das dúvidas filosóficas da psique,
Para mostrar continuamente seu poder e glória,
Pois só assim a alma humana se contenta em memória....
Que surja concreto, iluminado e tronitroante,
Esse Deus científico-lógico-matemático,
Que faça constante a justiça e de seu semblante
Se veja continuamente o ato pragmático
Se fazendo em voz, ação e reação brilhante
Ordenando a desordem e o caos problemático
Das sociedades, das incertezas políticas,
Do sofrimento da condição humana crítica....
Que libere seu amor como uma chuva de maná,
Que nos ensine com paciência o caminho da vitória,
Que perdoe nossos infinitos erros de pensar,
Que perdoe esse poeta e poema de pobre arte versificatória,
Que seu perdão contínuo nos faça mais e mais o amar,
E assim esse Deus idealizado pela ação do conhecimento,
Nos mostre o segredo de tudo e nos dê contentamento!
E, principalmente, que o Deus que inventamos
Revele-nos os limites d’além da Vida,
Que ressuscite os mortos de todos os milhares de anos,
Os faraós, os soldados desconhecidos, a criança desaparecida,
As vítimas de assassinatos, as da inquisição, os que matamos
Nas guerras, nas emboscadas, nas revoluções traídas,
As que morreram de acidentes ou por doenças,
As que o buscaram no martírio e na certeza de suas crenças!...
Que esse Deus feito pelo homem possa em ato infinito,
E conhecendo do Universo seu futuro,
Nos leve para além do Sol e nos mostre os astros mais bonitos,
E dominando o segredo da matéria e do escuro,
Nos tire todo medo, nos leve à felicidade do mito,
E ficando livres que ultrapassemos todos os muros....
Esse Deus surgido da mente lógica e da razão,
Fundará a nova idade do sentimento e da emoção...
E assim, felizes, por todo o sempre a humanidade!...
De certo, se existe Deus, este, anterior ao nosso,
Sentindo-se ultrajado, nos olhará sem piedade,
E com a ira própria de um Deus, buscará nossos ossos,
Nossas almas, nossos pensamentos e incredulidade,
Nossa obra mais ousada, o Deus autarcoglosso,
E num embate indescritível se fará a grande lida,
E vencendo o nosso, pois é Deus, repensará nossas vidas...
Talvez, nos veja não mais como seus filhos diletos,
Ou talvez perceba que nessa imensidão sem fim,
De astros, sistemas, galáxias, dimensões e objetos,
Necessitamos, por natureza de um contínuo “sim”,
De um “estou aqui”, de momentos concretos
Para além de sensações diáfanas, místicas ou algo assim...
Que queremos vê-lo nos mais variados templos,
Que sua presença aos nossos sentidos se faça de exemplo...
Nosso Deus inventado poderia até ser usado
Pelo Deus primeiro e único, do antes de tudo,
E para descanso da divindade, o deixasse ligado,
E falando ao Deus inventado, como num estudo,
Não notássemos a falta do verdadeiro, pois já cansado
De sua onipotência, ubiqüidade, fique mudo
E voltando ao seu retiro que nossos torpes sentidos
Não alcançam perceber, sinta-se, por fim, reconhecido!