A DAMA DA RETORTA
Depressão bateu em casa.
Entrou, fixou morada.
Era visita inconveniente,
Nunca fora convidada.
Pensei que partisse rápido.
Mas o tempo de cada uma,
Pálido e adoentado,
É incerto e diferente:
Eu penso que é muito,
Ela pensa que é pouco,
E de bocado em bocado
Sai esticando a estada.
Não gosto dela.
Não temos sintonia.
Mas Dona Depressão, parece,
Ama minha companhia!
Busquei despachá-la em surdina
Valendo-me de antiga simpatia:
A vassoura atrás da porta.
Nada feito.
Queimei alecrim com alho
Para afastar essa tristeza de borralho.
Decerto estava errada, fez-se torta
A receita de mandinga e alquimia:
A Dama da Retorta
Sempre aborta sua ida.
Arriscado jogo de dados
Sobre feltro verde e invisível,
Contabilizam-se os pontos
De Morte e de Vida.
Queda de braço
Enquanto mantém-se
Inusitado laço.
O resultado decidirá a saída...
Quem largará a máscara primeiro?
Quem sobreviverá por derradeiro?
Quem estará de partida?
[24/02/2006]
pintura de Gustav Klimt, "Hygeia" (deusa grega da Medicina)