Eis o que cantando na primavera eu colho
para os amantes
(pois quem senão eu entenderia
amantes e toda a sua mágoa e alegria?

e quem senão eu seria o poeta dos camaradas?),
colhendo atravesso o jardim do mundo,
mas logo passo pelos portões,

ora à margem do lago, ora me adentrando um pouco,
sem temer a umidade,

ora junto à cerca de mourões onde as pedras
ali jogadas, provenientes dos campos,
se acumularam

(flores silvestres e parras e ervas brotam
em meio às pedras e as cobrem parcialmente,
por tudo isso eu passo),

longe, longe na mata, ou perambulando tarde
no verão, antes de me perguntar para onde vou,

solitário, sentindo o cheio da terra,
parando aqui e ali no silêncio,

sozinho eu pensara: mas logo uma tropa se reúne
ao meu redor,

alguns caminham ao meu lado e alguns atrás,
e alguns me tomam pelo braço ou pelos ombros,

eles – os espíritos dos amigos queridos,
mortos ou vivos – se ajuntam mais, uma grande multidão,
e eu no meio,
colhendo, distribuindo, cantando,
lá eu caminho ao lado deles,

pegando como lembrança uma coisinha aqui e ali,
jogando para quem estiver perto,

aqui, um lírio, com um ramo de pinheiro,
aqui, do meu bolso, um pouco de musgo
que retirei de um carvalho que se vergava para o solo
na Flórida,

aqui, folhas de louro e cravina, um punhado de sálvia,
e aqui o que eu retiro da água, passeando à margem
do lago,

(oh, foi aqui que eu vi por último aquele que me ama ternamente e que retorna para jamais
se separar de mim,

e este, este será para sempre o sinal dos camaradas,
esta raiz de cálamo será,

troquem-no uns com os outros, ó jovens,
e nunca o devolvam!),

e galhinhos de bordo, e um monte de laranjeiras silvestres e castanhas,
e ramos de groselha e o cheiro das ameixas
e o cedro aromático,

tudo isso eu, cercado por uma multidão de espíritos,
vagueando, aponto ou toco quando passo,
ou jogo a esmo a partir de mim,

indicando para cada um o que ele terá,
dando alguma coisa a cada um;

mas o que retirei da água à margem do lago,
isso eu reservo

e o hei de dar, mas somente àqueles que amam
como eu mesmo sou capaz de amar.

 
                                        (Tradução de Renato Suttana)



          Fonte:   http://www.arquivors.com/


Walt Whitman (EUA)
Enviado por Helena Carolina de Souza em 29/10/2011
Reeditado em 30/10/2011
Código do texto: T3305753