NOVO FILHO, VELHO PAI

tardio,

o filho aguarda quieto a chegada

e espera a minha presença de pai,

responsável pelo amor absoluto.

Os anticoncepcionais, tão fundamentais,

deixaram-nos livres da culpa para vivermos em amor,

as camisinhas deram paz ao compromisso

apesar de guardarmos os corpos úmidos

para semens férteis e futuros!

tardio,

bem antes de saber se seria pai,

fui

pescador amador, aprendiz de adulto, florista de ocasião,

guarda de trânsito, poeta pouco, vendedor de enciclopédias,

contra-regra, hippie de butique, corretor de imóveis,

artista autônomo, analista de sistemas, sonhador,

gastador de amigos, operário-padrão,

funcionário-público e louco-varrido.

muito antes de saber que, um dia, pai seria

eu fui

extremamente responsável comigo e com todas as mulheres...

Não venhas ralhar ranzinza, ou se preocupar agora,

com as cicatrizes que acumulei, inconseqüentes, desde pouca idade

por causa da minha quase constante ausência de sapatos.

muito antes de imaginar que, um dia, pai poderia ser

eu procurei

levantar todas as saias e os sentimentos mais inverossímeis...

Não zangues comigo logo agora, tão fora de hora,

nem penses que vieste da flor, do pássaro, ou até do inesperado

como diria a tua bisavó: no bico da boa e velha cegonha.

muito antes de sonhar que, um dia, seria pai ao teu lado

eu perdi

toda a maturidade até regredir contigo numa simplicidade de criança...

Não berres no meio da noite; tua mãe, cansada, dorme!

o peito dela também esta guardado para a gula de minha boca:

vês como ela, feliz, se espreguiça entre nós?...