"Como matar a canção (ou como fazer sucesso)"
Rouba-se a melodia
De uma canção estrangeira,
Inventa-se outra letra,
Sempre à base de "besteira",
Falando em pornografia,
Cachaça, "ponta" e orgia
Que tá pronta a "roedeira".
Pra completar a doideira,
Basta mais um palavrão,
Usando português claro
Pra conquistar o "povão",
Cria-se um grito de guerra,
Pois não se canta, se "berra"
No decorrer da canção.
No dia da gravação,
Pra introduzir o CD,
Um locutor de voz grave
Faz o anúncio a você
De um show de qualidade
Que, pra dizer a verdade,
Só inocente é quem vê.
Para mostrar na TV
E tocar na FM
Tem que falar palavrão
Daqueles que a terra treme,
Num linguajar bem safado
Que um canta sossegado
Enquanto o outro só "geme".
Quem dá valor é quem teme
Djavan, Caetano, Gil,
Chico Buarque, Toquinho,
Kleiton e Kledir Ramil,
Fagner, Milton Nascimento,
Aos poucos, no esquecimento,
Ao lado de outros mil.
Esse pensar varonil
É coisa de gente brega,
Que se dane a qualidade,
Só é sucesso o que pega.
E depois, pra que moral,
Se o poder do capital
Mantém nossa gente cega?
Uma coisa ninguém nega:
Educação e cultura
É que transforma um país
E livra da ditadura
Que transformou o banal
Numa coisa natural,
Embelezando a feiura.
O presente é de agrura,
Está morrendo a canção,
A nossa vida futura
Trará a grande lição:
Uma geração doente,
Construída no presente,
Quem viver, dará razão.