Naquela madrugada eu poderia ter levado um tiro

Gregor Samsa tocando guitarra aos meus ouvidos

e eu penso porque diabos é tão bom descer

aquela rua

e imaginar um cachorro

escrevendo seu nome no chão com urina

e não conseguir abrir a garrafa

ou achar que a lua parece um ovo

e porque diabos é tão bom olhar para aquele rosto

tão magro e tão macio

e tentar entender como pode uma língua

ser tão macia

e ter tanta vontade de retratar tudo isso em uma tela

e fazê-la mais famosa que a famosa foto da Monalisa

momentos antes de seu casamento com Bob Dylan

para todas as pessoas verem o que é

um ser simples, pura e poeticamente belo

em toda sua complexidade

e gritos desesperados no banheiro

e de onde diabos vem a minha tão grande repulsa

por quem não olha nos olhos

Anna-Varney cantando aos meus ouvidos

e eu penso porque diabos é tão bom

pensar em morte e achar inspiração

em um poema de Poe cantado por Anna-Varney

e sua androginia e sua sexualidade abstrata

e em Daddy’s Girl

e em todos os coelhos e ratos com cara de demônios

e seus cérebros à mostra e bebês deformados

e em Nebreda e seus lindos ossos

e em mulheres e seus lindos corpos

e naquele rosto masculino e macio

poética, pura e simplesmente belo

que eu tenho vontade de retratar em uma tela

e fazê-la mais famosa que a famosa foto da Monalisa

momentos antes de seu casamento com Bob Dylan

e eu nunca acho as respostas

Mariana Schweiger
Enviado por Mariana Schweiger em 26/08/2011
Reeditado em 26/08/2011
Código do texto: T3182562