ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA (E. L. A)

O começo se inicia pelo fim,

A perda gradativa do meu ato de agir

Que se transforma em esforço

De um corpo que se deixa autodestruir.

Sinto os meus pés distantes de mim,

E a cada passo, o fracasso. Como assim?

É não poder caminhar por uma trilha

Que me traga alegria

E me faça sentir a beleza de um jardim,

Em um caminho, cujo objetivo

É o encontro da flor ou do espinho

Na busca de um conflito construtivo

Que me faça auto-refletir.

Uma medula deturpada, desativada,

Repleta de vias sensitivas

E motricidade, nada.

Tais neurônios superiores e inferiores

Que partem do meu córtex cerebral,

Passaram de aliados à inimigos,

Conduzindo-me a imobilidade bilateral.

O cansaço de levar à boca, uma colher

É o mesmo do percurso de um quilômetro à pé,

E a cada movimento,

A perda paulatina de cada membro.

Independência, funcionalidade e locomoção

São vertentes a bater em retirada

De uma identidade camuflada

Por perdas, esperanças e ilusão.

Procuro como um lunático, outro mundo

E descubro em meu peito um abrigo

É meu coração não atingido,

Única coisa a se mexer corretamente

Nesse corpo moribundo.

Medos e anseios inesperados

Partem de algo já esperado,

Planejado injustamente por uma patologia

Que me consome dia-a-dia.

Para Hamlet, a eterna dúvida...

“Ser ou não ser, eis a questão.”

Para mim, a impotente súplica

Ante a certeza da inanição.

O filósofo René Descartes

Em uma de suas famosas frases,

Proferiu: “Penso, logo existo”,

Filosofando sobre a razão humana.

Hoje irracionalmente persisto,

Diante dessa moléstia insana.

E nesse mundo de aprisionamento

Assisto inepto de camarote

O meu processo de adoecimento,

É uma angústia corporal, um sofrimento,

Um tormento que não aguento,

Deveras aborrecimento!

Que só aumenta com o tempo.

Na verdade, um cruel acontecimento,

Que me assola a todo o momento.

Quero o isolamento, alijamento, apedrejamento.

As vezes pareço alegre, é fingimento!

É uma máscara de encorajamento!

Desejo mesmo um estado de torpor, adormecimento,

Para então pedir a Deus, o seu consentimento,

E receber, quem sabe, a extrema-unção

Ou o sagrado sacramento.

"E. L. A" induz meu coração a sucumbir,

E quando a razão me faz querer desistir,

A emoção de viver me instiga a continuar,

Como um barco a deriva que não quer naufragar.

E no futuro premente como ficarei?

Já não sou como antes e nunca serei,

Minh’alma me desconhece

E pelo que me parece,

Sou mais um pássaro liberto

Que tenta voar com as asas cortadas,

Consolidando minhas mágoas

Pela reação intacta do sentir

E, portanto, não poder agir.

Queria ser o autor da minha própria sorte

Para ter com a morte – o meu chacal!

Um encontro num tempo bem distante,

E desejar apenas por um instante

Uma vida inteiramente normal.

E quando tudo parece estar perdido

Descubro algo que me acalma,

Um profissional de terapia ocupacional

Que transforma o meu mal

Em uma favorável condição biopsicossocial.

Realiza uma movimentação passiva

Que transforma a minha práxis inativa

Em algo totalmente real.

São cuidados paliativos e desejos de manutenção,

Que certamente serão perdidos

Por essa injúria em progressão,

E, apesar de tudo isso,

Esse profissional realiza o seu trabalho,

Num misto de vontade, verdade e dedicação.

Autora do poema: ÁDYLA LUCAS.

Revisor e co-autor: AUTISTA.

PS: Agradecimento especial a poetisa ÁDYLA LUCAS, grande amiga e colega do Curso de Terapia Ocupacional da UNIFOR (Fortaleza/Ce). Uma profissional promissora e uma pessoa muito especial que tive a honra de dividir momentos de criação literária.