Costume

Um dia ela abriu os olhos como de costume

e com movimentes lentos e precisos

antes de amanhecer o dia

já estava com a mesa posta e o café no bule.

Ouviu os discursos políticos do marido,

enquanto lia o jornal

e os porquês repetidos dos filhos

enquanto brincavam no quintal.

E a tudo respondeu com concordância,

satisfação e um doce sorriso matinal.

Como de costume.

Preparou as crianças para a escola,

pendurou a roupa no varal,

temperou a carne para a janta

aparou a grama do jardim

e podou algumas rosas no roseiral.

Foi a feira como de costume

comprou frutas, verduras e legumes.

Encontrou algumas vizinhas pelo caminho

e conversou sobre o tempo e as receitas do dia-a-dia.

Almoçou sozinha e satisfeita

como de costume

Lavou a louça, limpou a cozinha

como de costume

Arrumou seu quarto

como de costume

Encheu a banheira de água quente

como de costume

Misturou seus sais preferidos

como de costume

E tomou seus calmantes

como de costume

Lentamente encostou o pé na água

Acostumou-se com a temperatura

e relaxando com o corpo submerso

foi sentindo-se lentamente fraca

como de costume.

Mas seu relaxamento fora interrompido

por um grave suspiro desesperado

havia finalmente conseguido

acertar a dose dos comprimidos

e debatendo seu corpo na banheira

realizou o sonho a tanto tempo perseguido:

Tirar a própria vida que lhe parecia sem sentido.

Daniela de Andrade
Enviado por Daniela de Andrade em 14/08/2011
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