Moinhos Anatômicos
Engraçado é sentir o peso de voar.
O peso de cada soco de ar
Que bate na face felpuda
Com o carinho do sopro da concubina
Na ferida de sua prole.
Engraçado é sentir o carinho do frio
Que nos adoece.
Da poeira que nos suja e desconforta
Em nossa armadura de areia e cascalho
Que nos edifica e fere.
Engraçado é sentir os calos gritarem,
Se manifestando por nossos pés, como intérpretes
De mudo desconsolado.
Expressando-se através de cada furo no sapato:
- Pare, por favor! Pare de bom grado!
Engraçado é sentir o calor da insônia
E suas alucinações na câmara dinâmica.
Nas concepções da mente lucidamente ébria
De vontade de cair.
Engraçado é sentir a fúria atroz
Do grito de dor incessante do corpo,
Estalando pelos ossos como um instrumento de corda,
Desafinando cada pedaço de harmonia
Que é a angústia do absorto.
Engraçado é sentir...
Por apenas ter a ousadia de se desprender,
De colocar o dedo na areia
E se dar ao mundo que gira, incessante,
Em sua dança inerte.
(...)
Sentir a dança do mundo sapateando
E palpitando no peito é escutar a si mesmo.
Escutar a si mesmo é escutar o mundo.