O Choro

Ao ouvir, fechou os olhos e acurou o ouvido:

Era o choro de quem, na nascença, foi mal recebido,
na infância quase que esquecido.
O choro de quem, na adolescência, viu o ideal ser traído,
o abandono do sonho ser profetizado e cumprido.
O mesmo de quem, certo tempo, sentiu-se marido
e ao perder as poucas posses não pôde cumprir o que lhe era exigido.
O choro de quem sentiu o cheiro e o horror do cabelo e orgulho caído.
Daquele que temeu muito mais que a morte, ter o filho perdido. 
Do pecador que não foi redimido.
Do ateu petulante e atrevido. Mal agradecido.
Do solitário que se diz bem resolvido.
Daquele que pouco fala, por não ser compreendido.
Do que pouco vê, por achar que a Morfina sempre lhe deixa iludido
Daquele que se fecha ao Mundo, igual ao caracol escondido.
Daquele . . .

Quando abriu os olhos, só viu espelhos.