MINHA CIDADE DENTRO DE MIM

Faz muito tempo que lá não vou

Minha cidade morena na cor

Tanta coisa lá de mim deixei

Que um quarto dela no bolso esquerdo levei

Só a saudade infinda ficou

Os rostos que em mim passeiam

Ziguezagueiam no pensamento

São vielas perdidas dentro do peito...

Ah! As esquadrinhadas vilas de minha infância

Eram gigantescas avenidas portentosas

Com rimas e riquíssimas prosas

Mas na poesia da pobreza...

Pra um menino franzino

Não tinha outro jeito

Dobrar suas esquinas

Procurar outro destino

Subindo no parapeito

Com as mãos em supina

Pra se tornar outro sujeito

A paixão de minha infância perdida

A ânsia daquele beijo

Coração palpitava de desejo

Sacolejava que nem sovada de pilão

Quando segurava em meus braços então

Suava e tremia que nem mão de sambista

Batucando nervosamente o tamborim

Era a musa do meu jardim

Pra esta flor de menino

Não existia outra no mundo

Pra substituir este substantivo feminino...

Mas o tempo apertou o laço

Não se escolhe a vida pra viver

Apressa-se o passo

Pra velhice não correr

Agora depois de crescido

Tudo está tão mudado

Até o capim dentro de mim tem capitulado

Mais o que vivi tá pululando

Na memória qual arroz meio queimado

Tá grudado grudadinho...

Tanta opulência na minha terra

Meu cantinho minha parca vivencia

E fui embora buscando outra ciência

A essência é passageira

E eu um passageiro desta essência...

Tanta coisa passada que ficou pra trás

O destino vai filtrando em seu funil

As coisas novas que vão surgindo

É de praxe esta renova da desova

Só a borra do tempo vivido se desfaz chorando as horas

Às vezes buscamos a liberdade do lado de fora

E internamente aprisionados ficamos

Em nossas prisões de outrora