VELHA AMIGA

Cedinho, minha primeira visão: uma folha de papel

Sem nenhuma rasura, numa mesinha ao pé da cama.

Aquela folha de papel domina toda minha atenção.

É uma “folha pedinte” estendendo sua branca mão,

Em súplica, diz-me:- Sou amiga de todo menestrel.

Observo-a, coitada, tão vazia, nenhuma palavra,

Sequer uma letrinha; ali, sozinha, pede, clama.

Que mágico poder de atração uma folha em branco,

Tão pura, exerce sobre minha mente? Sou franco,

Ouvi-a dizer-me:- Pegue a caneta, e, em mim, lavra

Que seja um versinho, prometa, tenho fome de palavra.

Não espero mais, ferem-me o coração seus doridos ais.

Empunho-me de uma caneta:- dê-me estro. Rogo.

Sou tomado por forte verve, escrevo logo:

Folha de papel, és, hoje, deste poeta o mote,

Mas, serves à Humanidade, com seu precioso dote,

Desde remotas Eras: Com os egípcios, ainda pedra,

Conheceste os hieróglifos; com o Império Babilônico,

Após, por longo tempo, ter servido ao poder faraônico,

Aceitaste a rude escrita cuneiforme, com a qual se lavra

O severo Código de Hamurábi; foste pergaminho e papiro;

Dos poetas e dos apaixonados registraste o suspiro.

Concebeste Os Dez Mandamentos quando pedra virgem;

Dos fenícios, conheceste o código que ao nosso deu origem;

Em folha de papel a História da Humanidade foi exarada.

A folha já não estava mais vazia, e, muito emocionada,

Aproveitando do vento uma lufada, curva-se ante mim,

Como a dizer: - Muito obrigada. E o dia começa assim.

Manoel de Almeida
Enviado por Manoel de Almeida em 17/06/2011
Código do texto: T3041450
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