NÃO ESTAMOS SÓS.
Não estamos sós,
antes de nós vieram muitos.
Vieram tantos que deixaram rastros,
vieram muitos antes de nós.
Muitos querem que seja só a gente,
nesta terra tatuaram outros pés,
tantos pés que não se enlinhaçam com os nossos,
tantos pés, tantos pés bizarros.
Não estamos sós, já estiveram aqui outros, tantos,
gente que sabia das coisas da vida que desprezamos,
gente que inventou o fogo bem antes da gente,
vieram outros antes de nós.
Não fazem guerra, não acabam com tudo em volta,
sabem viver sem fazer morrer, sabem viver e só.
Antes de nós vieram muitos,
tantos que já nem sabemos mais, nem sabemos mais.
Posso dizer que sei muito deles, como sei,
certa vez quis saber cadê, cadê?
Fui atrás das cores, dos amores, dos senões.
Cavoquei tantas almas quanto pude pra saber, e nada,
vasculhei os sonhos de todos que vi e não vi. E nada. Nada mesmo.
Existem tantos por aqui que nunca serão dos nossos,
nunca foram e nunca serão frutos da nossa carne,
nunca foram e nunca serão remendos na nossa mortalha,
nunca foram e nunca serão pétadas do nosso suor,
nunca serão.
Foi então que ele veio, rastejando nas minhas ideias,
feito lagarta trêbada, feito sangue que foi cuspido banido,
veio sim, digo que veio, sim.
Chegou perto do meu ouvido e praguejou com absoluta calma,
com enxaguada cadência na voz, foi assim que ele veio.
Então pude me traduzir mais desfalcado de mim mesmo,
foi então que entendi as notas da solidão, do perdão e da paixão.
Foi então que esculpi nos úteros e ecos da minha fé o que deveria ser domado com raça e gozo de furacão.
Foi então que desfiz as minhas malas e voltei pra casa.
Daí pude então destampar meus poros pra serem untados, abençoados e recebidos de volta ao lar.
E pude finalmente deitar e dormir de vez. De vez.
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