Relicário
um terço de primeira comunhão
primeira e última comunhão
uma presilha viúva
íris de tule despedaçada
um Jesús lacônico, desbotado
segurando o próprio coração
onze medalhas de natação
ainda cheirando a cloro
uma bonequinha de porcelana
a boca pintada de carmim
protagonista aposentada de
grandes batalhas intergaláticas
de nenhuma cena doméstica
que eu eu me lembre
dois diários fracassados
confissões mentirosas
de quem escreve imaginando
quem as lê anos depois
retalhos de outrora
e no fundo do baú:
eu menina, doce-feroz
com presilhas de tule
medalhas no peito
cabeça cheirando a cloro
travando batalhas na areia
bem-mijada do parquinho
com bonecas de porcelana
generais de aventais
eu que hoje
mal me reconheço.