PAUSA
tua pele doce nunca lambuzou-se na saliva pegajosa da língua da morte
tampouco teus olhos de crepom cruzaram o ohar flamejante da morte
você sequer sonhou algum dia topar com o ceifador num lugar qualquer
seja no calor prazeroso e secreto de tua alcova ou no polo norte
e eis que o inesperado surpreende tua virgindade numa tarde de maio
e você sangra violado pela repentina estocada profunda vinda do nada
todo o teu jardim até então tão bem guardado se partiu na violência de um raio
a luz voltou pálida enquanto você juntava o que sobrou desse conto de fadas
teu corpo incólume de repente percorrido pelo calafrio causado pelo sopro da morte
trincou de cima a baixo sucumbindo ao duro golpe do plúmbeo martelo da morte
você sequer imaginou algum dia chegar ao fim do corredor cujas portas abertas
deixaram de ser portas e se tornaram gargantas profundas ardentes de azar e sorte
tua pele doce nunca tocada pelos dedos frios de unhas negras e agudas da morte
teus olhos de crepom nunca feridos pelo bafo de aguarrás e miasmas da morte
você se fez de cego quando tantas vezes exposto foste à ferocidade das mandíbulas
e embriagou-se na tua mentira de pretender atingir outro eden onde reinarias forte
e eis que a terra tremeu sob seus pés de bailarino e teus ossos valsaram até ruir
e o teu sangue antes nectar azedou num sumo negro viscoso purulento insalubre
toda a tua casa se desfez no infinito tuas raízes arrancadas tuas sementes sem porvir
a luz falhou e então apagou-se de vez ocultando tua segurança privando-te da distância
de perto pudeste ver a feiúra imoral de coisas ditas entre dentes desde a tenra infância
dos teus jovens dias quando nada sabias das coias do corpo, da libido e da morte
você sequer pensou mesmo febril ver-se despido e oferecido em tão significativo sacrifício
tanto tempo perdido no cultivo de um ideal apolíneo de perfeição, tanto de
desperdício