VERGONHA DE SER HOMEM

Ninguém sabe os nós

Que trago no peito

Que o destino malvado

Que aqui foi guiado

Pelas mãos do homem

Em cada cantos levo um susto

Em cada chão uma topada

De cada mão uma bofetada

De cada raiva um soco no estomago

A fome dos meus filhos

Somada a minha fome

Fome de comida, de família esquecida

Fome de esperança e dignidade

O governo teve ousadia

Levantou as casas de moradia

Mas esqueceu os endereços

De quem mandou prá lá

Triste vida de um povo

Que aceita o destino

Que labuta contra a sina

Por achar que assim Deus quis

O seu lamento

Não é senão indignação

De vergonha porque diz

É assim que o homem quis

Mesmo analfabeto

Tenho plena consciência

De que esse flagelo da fome

Imposto a mim e aos sofridos

Não é obra divina e sim dos homens

Não se pode enxugar, as lágrimas

Lágrimas que brotam

De um coração acanhado

De um coração vitimado

Por essa tal injustiça

Chora, chora os lamentos

Qual limite tem o tempo

De uma dor e desalentos

Para o estomago suportar?

É cega essa moral

Esse sistema social

Que abnega os direitos

De quem a vida ganhou

Essa loteria biologia

Que alguns não são contemplados

Muitos são esquecidos

Com seus direitos roubados

Me sinto habitante

De outro planeta

Planeta dos excluídos

De misérias e incertezas

Me fecho em meu silêncios

Dolorido, sinônimo de excluído

Desalento e desamparo

De não ter com quem conta

Imagine minha gente

Tantas bocas em jejum

Quando o amanhã desperta

Sem alimentos nenhum

Esta infinita canseira

Farofa, água e sal

Este castigo impiedoso

O sol de pina a pino

Essa noite sem remédio

Uma alma está ferida

Essa eterna espera

O seu sustento é a fé

E um silêncio vazio na alma

O tempo passa para todos

Mas o relógio é o mesmo

Continuo em desespero

Pois, o feito da hora é diferente

Quando é que nós vamos

Conseguir a aprender

A ler nos olhos

Aquilo que a palavra

Não consegue dizer?

E agora eu me pergunto

A que Deus vou recorrer

Se os Deus “poderosos”

Não consegue resolver?

Milhares de bocas incertas

Da comida de amanhã

De Maria de José, de Chico e Zé Coió

Mas minha fé ainda forte

Eu não largo, não, o norte

Pois nesse pedaço de terra

Eu ainda hei de morrer

Fica aqui o meu relato

O relato de um homem

Que um dia passou fome

Fome de justiça da

Vergonha de ser homem