Às distâncias

Às vezes o mar parece mais cansado.

Cansado talvez de ser tão sóbrio,

ou ainda, de viver tão longe

desses seus olhos que eu desejo tanto ver

perto dos meus.

Cada um em sua própria dor

e irrecuperável morte,

com violões, abraços,

músicas, amigos,

distâncias e mudanças.

Vejo que tudo é tão exagerado e forte,

sem percepção não posso sorrir ou chorar.

Talvez cortar os pulsos e cerrar os dentes,

misérias humanas não são espírito

como terra não se forma água.

Meu oceano, só de lágrimas o fiz...

não porque você estivesse aqui ou longe,

na verdade.

O mar, mais cansado da distância que eu,

bate com ódio nas pedras tentando rompê-las

em cacos de vidro para que eu me ajoelhe

e corte a pele e a carne,

e conto possa formar-se poesia.

Cem certeza,

com amargura,

com amor-próprio,

vista-se assim e continue dormindo.

Com lenços de sangue e lençóis de seda

perdida em pesadelos,

apoiada num velho travesseiro

a bailarina estava.

Morta, como o conto que escreveu-se

nas costas do autor mais sórdido.

Ali ela estava,

linda, livre, louca, leve e enlameada,

por causa de uma palavra de alguém.

Muito perto você se desafia,

tranquilamente sem pensar nas horas que vêm,

pra você, como para os outros amigos,

o caminho é largo e o vento é brando,

enquanto vento sou, não podendo ficar...

A verdade é que luto hoje para seguir em paz,

queria escrever que já sigo em paz,

mas meus dedos não mentem pra você.

Como ave, voa sobre minha mente

enquanto caminho em sonho;

no meu travesseiro já se passaram luas e luas,

nos meus chinelos, muita poeira e sol...

meus pés cansados caminharão sobre a terra...

livre ao ar e às árvores das manhãs,

abrirei os braços ao meu distante passado.

Do alto da montanha, agora,

contemplo as várzeas,

no silêncio das brisas que tocam meu vestido.

Não pensarei na volta e ela virá,

poderei então separar-me pra sempre do mar

e beijar-te olhando nos teus olhos.