AVE DA ATLÂNTIDA

Sou também

Entre as tantas coisas

Desistidas

Esta ave desnecessária

Sempre a voar-me

Ave última de sua espécie

Sempre a voar-me

Ave sobrevivida a dilúvio

Espectadora

Das horas finais

Da Atlântida.

Sou-me esta ave incansável

A escrever-me no ar

A história

De civilização finda

Há milênios

Esta ave sobrevivida

Única de sua espécie

Sobrevivida

Para viver a contar-me

Sempre

A mesma história

Sem enigma

Código

Esfinge.

A mesma história

A ser para sempre

Recontada

A história

Em que fomos

Descendentes das aves

Todas extintas

Nós que ao dilúvio

Sobrevivemos

Eu e tu

Inutilmente

Há milênios.

Ave-memória

Memória finda

Sem vestígios

Ave desnecessária a voar

Ao redor de nós

Sem descanso

Sem sentido.

Ave que é

Que permanece

Sem jamais a termos sido

Em lugar nenhum

Muito menos neste agora

Com ela

Esta ave

A nos voar

Desde sempre

Ave vítima do Silêncio

Ave destinada

A eterno descrédito.

Na noite de 17 de abril de 2011.