CAVALOS EM CHAMAS

Os homens sofrem demais.
Esperam o ônibus que não vem,
esperam a tarde que não vai,
não dormem à noite,
jazem sós, no frio da cama.
Os homens nascem para sofrer.

Os homens ambicionam recomeços,
desejam recompensas,
apostam suas almas
em jogatinas perversas.
O que querem os homens?
Aparecer diante de outros homens.

E se drogam fartamente.
Os homens bebem e se calam,
e gritam de repente 
levados pela loucura do momento.
Na rua, os homens dançam
na obrigatória alegria do Carnaval.

Os homens juntam moedas
e pagam prostitutas,
e doam dízimo às igrejas
de vidro e papelão.
Os pastores de porcelana gritam,
chamam os homens perdidos.

Igrejas de homens perdidos
erguem louvores a um deus
que só existe em seus pensamentos,
um deus reconstruído
de acordo com os seus desígnios
de homens sem sabedoria.

Os homens compram alegria,
mas a derramam nos vasos
das mais imundas privadas
de suas pequenas cidades.
E compram revistas que mentem
sobre o amor e a vida.

Mesmo o mais rico dos homens
tomba miserável diante
da clava impiedosa da morte.
E o amor, confundido com posse,
os escraviza mais e mais
nas senzalas do medíocre.

Os homens matam as mulheres,
os homens morrem pelas mulheres,
as mulheres caladas
acariciam as cabeças dormentes
dos homens semimortos.
Os homens nascem para sofrer.

A paisagem ferve.
Os cavalos vêm furiosos
rompendo a aurora,
cortando o deserto,
trazendo trovões nas patas,
queimando.

Os homens nascem para sofrer.