Encontro Marcado

Meu melhor vestido:

corpo baixo, talhe bem acabado

saia ampla, busto delineado

cintura marcada, fino bordado

negro cetim rendado...

salto agulha, ultrapassado?

cabelos presos no alto

coque antigo? bem feito.

Uma unica jóia ao peito

lembrança de vidas, perfeito!

comentam as pessoas ao redor:

que tez lívida, deviam usar mais cor

mas os olhos, sempre a fizeram bela

pérolas negras em sentinela

ora tambem no marrom da terra...

sempre apreciei seu porte, altivo

se bem que um tanto lascivo

onde ia, chamava atenção na hora

se nao pela meiguice de menina

seria pelo andar de rainha

ou pela candura de uma senhora,

veja, nao calunio, sou anciã,

mas nao esquecendo, claro, o olhar

ria sorrateira como cortesã.

Soltos corriam os comentários

cortezes, invejosos, hilários

mordazes, piedosos, pungentes.

Iam e vinham, olhavam, até insolentes

entre sussurros e silencios

saiam continuar seus idilios

aqui, ali, acolá, indolentes.

Musica, atenderam meu pedido

suaves acordes se ouviam no ambiente

algumas flores, poucas, singelas

entre a disposição das velas...

Tantas coisas a fazer, tantas desfeitas

já nao há tempo, ficaram imperfeitas

as tentativas vãs de um acerto só.

Por muito tempo esperado

foi o encontro marcado

é chegada a hora, afinal:

no esquife repousa meu corpo deitado

meu melhor vestido, maquiagem, calçados

que siga o féretro, minha alma voou

nao sou mais um ser aprisionado

nem tao pouco esses restos mortais.

Pare, nao chore, estou bem...

os afetos carrego comigo, bem junto

as emoções impressas na alma que se vai.

Ficas, recorda-me sem dizer adeus...

estás no meu coração como estarei no teu.

Nosso reencontro? Nao sei, nao me foi contado

mas haverá com certeza, nao será cancelado

todo encontro de amor ja está marcado

em uma dobra do tempo, será consumado

como este com a Morte: encontro sagrado!