Considerações sobre o medo

Há uma hora que tenho medo

hora de absoluta exasperação

hora em que as bocas só mastigam

pensamentos angustiosos

e nada lhes agrada o paladar.

O vinho mais doce

ainda é amargo

a carta mais terna

soa a coisa falsa

o violino mais plangente

desafina

e qualquer música

por mais bela que seja

ainda é uma agressão

ao nosso silêncio.

É desta hora que tenho medo

esta hora vazia

esta hora sem consolo.

Não tenho medo dos ditos acidentes ambientais

da fúria tempestuosa da natureza

nem terremotos, nem dilúvios;

tudo não passa de tristes noticiários

que chegam a nossa casa

em forma de espetáculo.

Não, não tenho medo de avião,

nem das guerras, nem da fome.

O que tenho medo é do homem

o homem que me habita nestas horas malditas

é do homem que tenho medo

o homem e sua profunda indiferença.

***

Alex Canuto de Melo
Enviado por Alex Canuto de Melo em 23/03/2011
Reeditado em 23/03/2011
Código do texto: T2865728
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