FRAGMENTOS DE NOTURNO
FRAGMENTOS DE NOTURNO
O mundo de visões que estendo
Diante desta tela fosca de vidro
É um mundo novo feito do mundo antigo.
O poema que escrevo agora,
Neste momento que acende uma grande ilusão,
É feito da essência poética do meu coração.
Queria ser o poeta que espalha sonhos
Nesta ventura turva das entranhas imundas
Deste mundo vil contagiado pela antipoesia,
Que se espalha diariamente ao meu lado.
Um poeta completo que lê até mesmo bazar de ritmos,
E os copia sem que lhe seja dado este direito.
Ritmos que gritam, vibrações...
Como guizos finos e estridentes.
Essas linhas loucas, cheias de alternâncias...
É porque meu ser se agita em pedaços
Produzindo rapsódias vivas dentro de mim,
Contentes e infelizes, santas e meretrizes,
Que rezam e cometem pecados...
São leituras de livros que vejo na estante do meu quarto,
Que saltam na minha direção,
Querendo acasalar comigo para reproduzir mundos estranhos,
Tristes, contentes, concretos, abstratos, objetivos, subjetivos,
Rimados, ou não, enfim um vasto mundo
A ser explorado por não sei quem.
Se eu for contar, hão de rir, talvez, como escrevo agora.
Deixe-me apenas dizer que há um cigarro a sonhar no cinzeiro.
E eu fitando a fumaça, que sobe pelo ar, penso no próximo verso.
Nestes trechos de noturno, há sempre um copo ao lado,
Ajudando a sintonizar meu corpo e minha alma
Ao jazz que toca sem parar...
Distraio-me, às vezes, quando fico imerso ao som...
Lembro-me de Franciele, casada, com filho,
Feliz, talvez, sem mim por perto para lhe chamar de Franci.
Olho a cama! Ela está vazia, mas cheia de esperança.
Meu caro amigo, Jorge, me lembrei de ti neste poema,
Havia uma cigarra morta nesta noite chuvosa de verão,
Lembra-te? Completamente roída e estragada,
As formigas a levavam...
Até hoje eu não pude compreender,
Por que mesmo que as cigarras e os poetas não deveriam morrer?
Não sei! Mas gostaria de saber.
Canta, Maria! Enquanto escrevo, canta!
Se ela te ouvisse cantando, lembraria quando a deixei encima da mesa,
Amando-a, querendo-a tão somente...
Sem espantar as sombras do passado,
Tive que engolir esta deliciosa ironia.
Este fim, na verdade é um desabafo,
E, nele, sorrio diante desta tela fosca de vidro.
Com licença para dizer, meu caro poeta,
Acaso alguma vez já te espantaste quando riste?
Pois bem, minha alegria é, às vezes,
Uma exótica maneira de dizer que estou triste!