A Teia Poética

Sujo

Esdrúxulo

E sentimental.

Estas sonatas que não são tocadas

Estes poemas não declamados

Estas vestes que apertam demais.

A capa do banco – azul

Tão costurada que teia

Teia e faz sons – fortes

Do caminhão que ronca

Do barriga que ronca

Do esfomeado voraz.

Dos sapatos “calejantes”

Esfarrapando a pele fina

Comem a pele da vida

Expõem a dura casca da rima.

E fedem à privada do cais.

A mochila de couro

Marrom

Pousada sob o banco

Azul

Não tem vida

Nem sentido

Não tem relógio

Nem dito

Não tem pensamentos

Não tem cérebro nem vagina.

É apenas

Uma mochila de couro marrom.

Como também são apenas

Os fones de ouvido

Pedras, foices, cuspes

Sofridos

Aos olhos de sois.

Já aos olhos

do poeta,

Uma mochila de couro marrom

Tem vida, tem rima, tem poesia

Caminha e tem mar.

Uma pedra não é pedra,

Uma pedra é todo o universo

Uma pedra é versejar.

Assim como

O assobiador,

Que faz sons

Pra Maria rebolar

Tantas Marias

Tantas reboladeiras

Tantos assobiadores.

Rodas a girar

Assobiante à Maria

Mulata

De saia rodada

Mulata de sorriso estampado

Mulata que deixa rolar.

Minha filha (que ainda não tenho)

Quer namorar

Está indecisa minha filha

Entre o construtor e o artista

Entre o cimento e a rima

Entre a régua e a poesia.

Disse eu p’a minha filha

Enamore o construtor

Que constrói o artefato sólido

Ao artista rimador

Que faz gestos ao léu.

O que pode acontecer minha filha!

É que você se cimente, se engesse e se empoeire

E vá velejar

No mundo abstrato e puro

Do artista rimador.