Focius I
A mesa dura derrotou o azul
e os habitantes catam letras
em asas fossilizadas;
o vidro resiste à visão humana.
E rojam por velozes transparências
por suaves vozes, por deferências vis,
os homens, as mulheres, as crianças.
Ninguém enxergou a explosão da rosa
ou o ruído sutil da água da chuva
a descer a rua.
Ninguém escutou o leve arroto do bebê
ou encostou o rosto à pedra,
para sentir a frieza do sal do planeta.
O cimento jaz sem companhia nesta hora sem sentido,
nu, rasgado ao meio, sangrando fedores seviciantes,
olhando para dentro, com seus olhos vazados,
sua boca de lobo babando ratos,
seus cabelos de lâmpadas,
porque já não há mais seres neste recinto,
os espectros foram apagados diante dos cinemas,
os filmes estão realizando as revoluções.
As revoluções do nada.
Meninos brincam sem bolas, sem carros, sem bebidas,
utilizando recursos banais como:
a solidão,
o calar-se,
a violência,
os apetites.
As cirandas estão proibidas pelo costume,
dar as mãos é considerado gesto obsceno,
cantarolar foi banido. Gemer é mais sereno:
é-nos forçoso então fazer sexo à distância.
Nosso tempo de culatras...
A sujeira se acumula.
Ser limpo parece servil.
Ser justo parece servil.
Ser forte parece servil.
No quieto da madrugada o ermo remexe,
travestis dançam maravilhadas
dando seus telefones a muito mutantes,
criaturas insinceras.
O desejo escraviza o sim! e o ócio s'esboroa.
Uma mosca perturba telescópios,
um milhão de estrelas s'esfuma
no vôo de uma borboleta.
A sujeira se acumula. A vontade tenta,
tenta a vida inteira.
Um milhão de dólares s'esfuma
num vôo da Air France.