QUANDO AS PRIMAVERAS APRENDEM A VOAR
Canso-me, antes do anúncio da chegada do trem
Pelo sino fatal escondido na torre da estação,
Mas quero manter-me desperto. Vivo.
Não quero mais janelas no meu quarto.
As janelas me deixam enrugado. Por elas entra o tempo.
Quero só primaveras. Primaveras quentes.
Que elas invadam paredes adentro,
Se instalem em minha cama. Em meu corpo.
Me cubram de flores. Me façam feliz.
Que as primaveras não me deixem esquecer de amar.
Quero ter a esperança de corações buliçosos.
Um coração envelhecido dói.
Coberto por terminações nervosas e sentimentais
Dói como qualquer outro órgão. E dói muito!
Quem me dera não doesse. Não sentisse.
Quem me dera não amasse tanto,
Nessa idade cheia de curtos anos.
Cheia de desenganos.
O que será que envelhece tão bruscamente o coração de um homem?
As ilusões? As desilusões?
...
Os jovens não envelhecem nunca.
Os anos dos jovens são longos. Demoram findar.
Eles têm a pela lisinha,
o rosto ingênuo,
o andar desleixado,
uma liberdade que
só eles conseguem espalhar,
por conta dos sonhos.
Por conta de um coração invulnerável.
Isso os torna fascinantes. Têm eles um amor ágil e fácil.
A nós, velhos,
só resta aceitar as mazelas e delas debochar.
...
O que me mantém vivo é o pé de moleque;
brejeiro fica invertendo a direção dos sentidos
e mandando a morte passar adiante.
Teimosamente, permaneço amando.
Não sei como. Não sei o por quê. Não sei quem.