ESTÚPIDA E DESNECESSÁRIA

uma manhã desnecessária

nos provocou até cumprir o acordar

numa louca vontade de dizer: - “ Bom-dia”

a manhã, tão estúpida e desnecessária

quanto a cama, não usa pasta de dentes!

Despertamos inusitados:

corpos acasalados e acomodados

num frenesi de juntar as almas

longe das roupas de dormir, desusadas,

num festival de nudez desconcertada

encoberta e vestida pela flor do pelo em pele.

Ah, desnecessária e estúpida manhã,

para que acender

a claridade se queremos o silêncio de cortinas?

Nenhuma claridade, naquele instante,

poderá falar

mais que o corpo que cobre o outro à luz da sombra!

mas,

se a estúpida e desnecessária manhã

nos fez desacomodar suavemente os gestos

à procura do nosso lado de dentro encoberto,

nos fez abrir preguiçosamente as pálpebras

à procura do nosso lado de fora entreaberto,

que importa

se a noite foi um agonizante fim de dia

ou se o dia será um inesperado fim de noite,

se somos os meios, os inteiros, os totais

ou os complementos do estado de espanto.

Agora, dorme, manhã de “bom-dia” tímido,

junte em sua mala nosso cheiro, suor e sabor

nesse espaço de dormir a dois, o cansaço

dado de presente pelo espaço, a cama

desnecessária para deitar em par.