TRISTE
I
Estou triste. Não mais consigo
Escrever tristes poemas.
Não imagino o que possa ter acontecido a mim.
Logo eu que alardeava meu pranto e fazia
Dele minha marca.
II
Não posso acreditar que acabou
A inspiração para a melancolia.
Exijo minha dor de volta.
Não há canção ou poesia sem dor.
III
Invoco todos os deuses e deusas que conheço:
Azevedo; Goethe, Byron; Plath, Espanca...
Quero porque quero minha perturbada alma de volta.
Quem teria coragem de praticar tal covardia,
Quem seria esse impiedoso, que tiraria de um homem
Sua fonte de inspiração e não lhe dá nada em troca,
Algo que lhe sirva de inspiração para seu culto a Apolo!
IV
Estou suspeitando de que a culpa, toda a culpa
É dessa tal Felicidade. Penso mesmo que ela
Furtou-me as lágrimas e as doces tristezas que
Auxiliavam-me em minhas azevedianas poesias.
V
Pensando mais um pouco acho que sei até a quem
Ela designou tal tarefa. Certamente isso tem o dedo
De Hermes. Sim, agora me recordo de ter sentido
Uma picada no coração. Uma fina e desagradável picada.
Não resta mais dúvida. O AMOR foi quem secou minha tristeza.
Ainda bem que inda há esperança para mim, pois conta-nos
Os fatos que o AMOR nada mais é que uma espécie de paliativo,
Quando não um placebo, criado e recriado pelos homens
Para dar significados outros para a vida em sociedade.