Pássaro de sonho
Pois se meu sonho é também ação minha,
se das noites adormecida tenho também a culpa,
se das manchas em meu travesseiro sou a vinha,
se esse vinho é, pois, traição... desculpa...
pois traidora sou
em meu leito entregue ao sono.
Se trair se configura em sentimento...
ai, Deus, do sentimento não sou dono.
Quanto me ardem os átomos do desejo,
minha alma se esvai e não se acalma,
dói-me a lembrança de ter perdido aquele beijo,
e quase me fecho em trauma.
Daquelas escadas de sonho,
de doce glória me pego, agora, em saudade;
ai, quem me dera! Ser brilhante como o Sol,
e desfazer essa maldade.
Traidora, sim, posso ser...
perdoa-me a paixão irremediável
que carrego no peito sem poder...
ai, dor, sem poder saciar o insaciável.
Perdoa-me quem me ama,
se de amor por ti não vivo;
infeliz alma minha que sonha longe da fria cama;
sonhando, ao menos, possuo alívio.
Ai, Deus, pudera eu ouvir!...
ouvir aquelas palavras com sinceridade,
voltar contente àquela casa e a espiral escada subir,
para ver teus olhos dentro da verdade.
Verdade minha de sonho,
você tão perto das minhas superfícies,
mas digo com olhar tristonho
e interior (traidor) cheio de imundícies,
que talvez santa seja porque sou sincera,
meu corpo se dilata e se contorce feito fera,
enquanto a alma (tanto calma) se vai,
chegando perto de meu doce anjo... ai.
Doce, doce anjo, maligno olhar de anjo,
quanto te quero! e sofro.
Sofro pois sei que nunca mais poderei te alcançar
e te tocar, beijar (quanta saudade de teus beijos).
Anjo, possa eu, ao menos, sonhar com você...
sonhar como essa noite sonhei, sem nem te tocar.
Em todo caso, ver teus olhos e ouvir-te a voz...
isso já será meu céu!
Canta, pássaro, canta...
que meu vivo sonho vivo fica em meu dia,
traidora, apaixonada e santa,
só do sonho minha alegria.
E deixa-me o sonho, por amor...
...
(espaço de tempo para, então, finalizar o poema)
!
Como louca pelos largos corredores,
alargo a vista e te busco,
procuro-te em tamanho desespero
que me disparo.
Agora nada me agrada
além da bela contemplação de seus olhos.
Terá você também sonhado meu sonho?...
Olho-te dentro da alma e pergunto.
Azeda amargura de saber...
que pena, anjo, meu anjo,
saber que não posso.
Saber que sobre minha vontade,
aí estão as pedras do meu destino.
Não creio em destino...
Sonho você, então...